quarta-feira, 3 de abril de 2013

Hamlet e o golpe de Estado

É mais ou menos assim: Hamlet avança para atacar o rei Claudius, pronto para apunhalá-lo. Está pronto para atacá-lo, decidido. Mas o rei está... rezando. Na hora em que o vê em momento de limpeza espiritual, Hamlet percebe que não pode matá-lo, pois morrer orando significa purificar sua alma. Decide esperar um pouco mais, para que o rei, em um momento de pecado, morra sabendo que sua alma está suja.

Hoje, os vilões das historias reais também sabem disso. Sabem que não podem ser atacados enquanto estão rezando. E é por isso que resolvem ficar rezando o templo inteiro, mesmo sem acreditar verdadeiramente em deus, ou mesmo sem querer o bem do seu próximo. Essa é, na verdade, uma maneira de defender-se dos ataques da sociedade. Ao mínimo sinal de perigo, gritam: "hey, povo de deus, vejam! Estão atacando um homem santo!". Então eles são salvos pela multidão ensandecida, religiosamente seguidora de suas mentiras pecaminosas.

Porque seguir rezando é também uma maneira de controle social. As pessoas estão sedentas por um messias. Estão esperando há dois milênios pela vinda daquele que vai acabar com o pecado e o sofrimento nas suas vidas. Só que Godot não chega, nem vai chegar. A necessidade de ter um líder é tão grande, que qualquer um que tenha autoconfiança e ganância para dar um passo à frente e reivindicar a liderança, a terá. Como na velha piadinha sobre o grande amor, enquanto o líder certo não chega, estas pessoas "vão se divertindo com o errado".

"Sua vida é tão vazia que você não consegue pensar numa maneira melhor de passar estes momentos? Ou você fica tão impressionados com a 'autoridade', que dá respeito e crédito a tudo e a todos os que dizem ostentá-lá?" Fight Club.

A religião protege os malfeitores desde os tempos de Shakespeare. Na verdade, desde muito antes. Shakespeare apenas se deu conta disso e colocou no papel. Em nome da igreja os malfeitores foram longe demais. E, em seu próprio nome, deus mandou matar muita gente, desde o antigo testamento até hoje.

Hoje, amigos religiosos, o diabo esta tomando proporções muito maiores. Não se esqueçam de que ele ficou tentando Jesus no deserto com mil riquezas e delicias que só sendo muito santo alguém teria negado. O diabo se veste bem, fala bem a uma multidão apaixonada, faz chapinha no cabelo e sempre aparece bem alinhado em publico. Mas por dentro ele é podre, oco, fedorento. O diabo tem o poder de encantar as pessoas ao ponto de fazê-las cometer os piores atos possíveis. Não se esqueçam que Jesus disse: muitos virão em meu nome e enganarão a muitos (Mateus, 24-5). Amém.

Hoje a gente percebe o quanto todos esses séculos de dominação religiosa fez mal pra cabeça do povo. Sempre volto ao mito de Platão e sempre penso em indicar esse livro maravilhoso do Saramago chamado A Caverna. Leiam, quem ainda não.

O problema é que Claudius, o oponente de Hamlet, se encontra em um lugar feito especialmente para momentos de reclusão espiritual, fervorosamente concentrado em suas orações. Pergunto-me se Hamlet teria hesitado caso o rei estivesse rezando na sala de casa, depois de tomar um mate. Não sei. Mas o símbolo do lugar, do "espaço sagrado" é algo a ser levado (muito) em consideração. Então, na ânsia de ser protegido, o vilão tenta transformar em igreja todos os lugares por onde ele anda, inclusive lá onde não se deveria falar de religião porque não vem ao caso. É por isso que agora já estão fazendo shows evangélicos no púlpito do plenário. E daqui a uns dias ou alguns anos, vai ser costume começar a sessão rezando um pai nosso. Como já acontece em muitas escolas no DF (apenas mais uma forma de torcer o pepino desde pequenino).

Mas algo mais grave vem por aí. Em Hamlet (olha o spoiler, hein?) o cara demorou tanto para tentar tirar o rei de lá que quando o fez foi tarde demais. Tomou um veneno mortal e acabou morrendo junto. A galera se acaba em uma orgia de espadas e veneno e a peça termina por falta de personagens. Ou seja, todo mundo se fode. Talvez mais uma marotice do cara lá de cima, que gosta de matar pessoas?

A cruzada contra o mal já começou. O mal esta no poder, ganhando muito dinheiro em cima das pessoas amarradas no fundo da caverna. Hamlet tem que conseguir resultados práticos o quanto antes, que é para a luta não esfriar, e para não correr o risco de morrer junto no final.

E o resto será silêncio... até alguém gemer um aleluia no horizonte.
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