quarta-feira, 3 de outubro de 2012

De como o Facebook minou qualquer escrita aprofundada.


"Maico,

Não tome esta carta como uma afronta, ou uma cobrança vazia sem razão. Não queria expor tua figura assim em público, mas não consigo pensar em outra maneira de me dirigir a você e de ter um retorno válido se não for por este meio. O fato é que tenho me sentido muito sozinho e gostaria de falar sobre isso. Andei me revisando nos últimos dias, pensando em tudo o que passamos juntos e relendo a quantidade infinita de coisas que você resolveu expressar através de mim. Foram épocas boas, ricas de conteúdo, onde eu te ajudava a entender algumas coisas do mundo e você criava meios de isso chegar até outras pessoas de uma maneira indireta e impactante. Lembra de quando você me revisitou e buscou vários textos que tinha escrito, chegando a montar um espetáculo com eles? Pois é... talvez isso não teria acontecido se você não tivesse trabalhado uma produção textual tão rica naquela época.

Vou direto ao ponto, para não parecer dar voltas sobre o mesmo assunto. Eu sei que o Facebook é popular e que todo mundo o “curte e compartilha”, mas é ele quem está minando nossa relação. Não, não é um ciúme besta de um site contra outro, mas desde que você começou a dar mais atenção a ele do que a mim, suas idéias ficaram mais vazias, mais imediatas e com menos – muitos menos! – poesia.

Vocês, os seres humanos, são sempre tão imediatistas... carregam tanto essa vontade de serem lidos imediatamente, de serem populares, de terem um número razoável de likes assim que postam qualquer coisa... todos buscando aprovação e aceitação o tempo inteiro em tempo real... já parou para pensar nisso, Maico...? Já se deu conta de que nessa tua busca por aceitação o teu conteúdo ficou cada vez mais vazio? Não que eu ache que sou a única maneira de provocar um engrandecimento do teu ser, não é isso. Mas sou um veículo para isso, entre tantos outros.

Quer exemplo concretos? Antigamente, quando você gostava de um vídeo, o recomendava aqui, como fez com o Darth ou com o Beirut. Isso valorizava o vídeo, você o tratava de uma maneira especial, colocava a letra das músicas que te diziam alguma coisa (lembra da Piaf? Ou do Johansen?). Lá no Facebook qualquer vídeo que você postou nos últimos tempos se perdeu... eles não ficaram marcados na tua história, perderam a importância que tiveram no momento.

Lembra das tuas reflexões sérias...? Não eram apenas gritos, eram poesia. Eu sei que você andou relendo Les Ephemères e se emocionou de novo. Eu sei que você revisitou suas reflexões de onze anos. Já imaginou o que tudo isso teria virado se fossem postagens de facebook? Provavelmente uma frasezinha para chamar atenção, alguns likes e comentários espirituosos e deu, teríamos um conteúdo para sempre perdido no limbo da internet. Aqui as coisas perduram... tanto as bizarrices (o que foi aquela notícia italiana?!) como os momentos sérios de conflito (Under Pressure... grande momento do teu espetáculo, não...?).

O que peço aqui é um pouco de atenção com quem te faz evoluir como pessoa: paradoxalmente, um meio eletrônico e tão artesanal como um simples blog. Este ano você publicou aqui apenas duas vezes. Você não construiu apenas duas idéias interessantes este ano. Além disso, você está devendo uma resposta ao comentário na postagem da bicicleta desde janeiro...! Isso não se faz...

Maico, lembra do teu compromisso assumido no dia em que eu nasci, há quatro anos. Você falaria aqui de ‘teatro, trânsito, vida, arte, viagens, amigos, cidades, remédios, materiais diversos, teatro, livros, cinema, comerciais, teatro, saudades, chatices, sofás, perguntas sem respostas, respostas sem perguntas, pesquisas, teatro, amigos, trânsito, impressoras, livros, dores, fatos, coisas, provas, música, sabonetes, luzes, carros, trilhas, portas, chãos, malas, chocolates, escadas rolantes, professores, teatro, tapetes, horas, joelhos, almofadas, enfeites, gente, leis, vinhos, hábitos, curiosidades, oportunidades, ditos, não ditos, cadeira de faculdade, cadeiras de madeira, sonhos, diálogos, desafios, balas, rios, anjos, astronomia, árvores, estupidezes, gentilezas, alegrias, pizzas, eletro-eletrônicos, férias, política e tomates.’ Continue falando disso. Você não será muito lido, nem muito aprovado, não terá muitos likes nem muitos comentários. Mas terá um pensamento construído, não apenas um pensamento jogado na rede.


Obrigado por me ouvir.


Um abraço grande,


Maico sem Ene."




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