terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

O Espaço Vazio


A folha em branco, o tema livre, a agenda em branco, o tudo pela frente. A sala vazia, o tudo é possível. Invejo os decoradores. Invejo aqueles com a capacidade de olhar para o vazio e visualizar o que ainda não está lá. Invejo o arquiteto que olha o terreno e tem a noção exata de como quer que fique o prédio, a casa, a ponte. A página em branco. O poeta que vislumbra o poema, o desenhista que adapta as proporções do traço ao tamanho da folha, o grafiteiro que se pendura no prédio disposto a fazer uma árvore nascer da pequena caixa d’água e se estender por toda a lateral do edifício, com todas as suas nuances de luz e sombra, de profundidade, tonalidade e formas. Aqueles que criam sobre o vazio. Aqueles que saem de férias sabendo como vão aproveitar o tempo. Aqueles que têm um dia livre e não o desperdiçam tentando fazer tudo o que não podem em um tempo que não têm. A vida é uma página em branco, dizem, difícil é não enchê-la de rabiscos desconexos e sem sentido. Dar forma ao que ainda não é. Pensar sobre o invisível, ver algo que ninguém viu ainda. Saber retirar do bloco de mármore apenas o que não é a estátua, apenas o que está atrapalhando a visão daqueles que ainda não perceberam que ali existe uma estátua emparedada. Desemparedar a estátua. Redecorar o ambiente. Distribuir o tempo na agenda, o traço no papel, os elementos no palco. Criar sobre o vazio. Respeitá-lo, respirá-lo. Entender o que o vazio pede que se faça com ele. Escutar, assimilar, visualizar, projetar, criar, assumir as escolhas para se permitir deixar algo aflorar. Câmera na mão, ideia na cabeça, ação.

Se o mundo por vezes é uma página em branco, eu passarinho. Eu, gota de tinta multicolor, pincel e artista, que me imprimo constantemente no vazio, tentando ser fiel às minhas proporções, cores, profundidades e estéticas. Criando sobre o nada.

Minhocão e o pé de feijão.
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