sábado, 1 de agosto de 2009

Não é desculpa

Quantas vezes você foi ao teatro esse ano?

Você saberia dizer o porquê de este ser um número tão baixo?

De acordo com a reportagem de Maria de Luna, publicada no Guia da Semana, do site Hagah, o fato de as pessoas não irem ao teatro está diretamente relacionado com o “alto preço” cobrado pelos ingressos. O que Luna esquece de contar é que existem muitas e muitas opções que envolvem um gasto financeiro muito baixo – ou mesmo nulo – para aqueles que querem ir ao teatro.

“Frequentar a cena cultural das cidades deveria estar ao alcance de todos, mas infelizmente não é o que ocorre na prática, principalmente, quando o assunto é teatro. Os altos preços - como 50, 80, 100 e até 200 reais por um ingresso - impedem que a grande maioria da população usufrua do que é um direito básico: cultura e lazer.”

Em Porto Alegre, por exemplo, existem vários projetos que liberam a entrada ou baixam tanto o preço a ponto de cobrar um valor irrisório. E isso, ao contrário do que se poderia pensar, não significa que o trabalho em questão é mal feito – apenas que ele está inserido em um projeto que o financia justamente para que o público não tenha que arcar com essa despesa. Se isso funciona? Bem, na minha opinião, não. Mas isso é assunto de um próximo texto. Além disso, mesmo pagando ingressos que vão de 50 a 200 reais, como citado no trecho aí acima, vamos encontrar muitas coisas que não valeriam meio ingresso de uma peça gratuita. Então, preço não é sinônimo de qualidade.

Só para citar alguns desses projetos, podemos lembrar que eles estão presentes desde o teatro amador (Projeto Novas Caras, da prefeitura porto-alegrense, e Teatro, Pesquisa e Extensão, da UFRGS, por exemplo, que têm entrada franca), até o teatro profissional, através de financiamentos públicos – é o caso dos cinco espetáculos apresentados em comemoração ao aniversário do grupo Teatro Sarcáustico, ou da programação permanente da Usina do Gasômetro, por exemplo, que sempre conta com espetáculos gratuitos realizados pelos grupos que a ocupam.

Vamos aos fatos: Hoje, em Porto Alegre, tirando os espetáculos com entrada franca, você pode ir ao teatro pagando a partir de 12 reais. O preço sobe de acordo com a procedência do espetáculo e o teatro onde está (espetáculos gaúchos raramente transpassam 30 reais, espetáculos em excursão, que ficam apenas um final de semana na cidade, transpassam, e bastante). Agora: não é engraçado como um teatro que cobra mais de 80 “pila” está sempre cheio e o que cobra 12 não? A resposta é: não, não é engraçado. Até porque se você for estudante ou maior de 60 anos, você tem grandes chances de pagar apenas 6 reais neste teatro que já é barato (porque as produções que ocupam estes teatros se preocupam em facilitar o acesso deste público todos os dias da temporada. Vai tentar pedir 50% de desconto ali no teatrão conhecido, vai...). O resultado é que a produção local, por melhor que seja, acaba sendo menosprezada pelo público justamente por não ser conhecida.

Ora, a título de comparação, uma entrada em uma casa noturna não sai por menos de R$ 15,00 e não são raros os lugares que cobram mais de R$ 8,00 por uma cerveja long neck – e as festas continuam acontecendo.

A pergunta a seguir pode até parecer forçada ou tendenciosa, mas: Por que as festas continuam acontecendo e os espetáculos correm sempre o risco de serem cancelados? (sim, você já viu festa cancelada por falta de público?).

De acordo com a opinião de vários artistas com os quais tive a oportunidade de discutir sobre o assunto, um dos fatores é que “o público” não tem o hábito de ir ao teatro. Assim, não prestam atenção na divulgação teatral local e só vêem o que a grande mídia mostra: os espetáculos grandiosos, com alto poder de divulgação e a presença de atores conhecidos – que normalmente têm um custo muito alto e por isso precisam subir o preço dos ingressos.
Enquanto as pessoas continuarem achando que não podem ir ao teatro por motivos financeiros, os artistas que trabalham a preços acessíveis são prejudicados pela idéia pré-concebida de que teatro é caro e de que preço é critério definidor de qualidade.

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A propósito:

1) Prestem atenção às palavras do diretor da Cia Antropofágica, no texto de Maria de Luna.

2) Vem aí o Vale-Cultura. Bom ou ruim? Leia isso. Depois este texto. Depois este. E este.

3) Acessem o Hagah e tentem encontrar o que, de porto-alegrense, está em cartaz.

5 comentários:

bertha díaz disse...

maico, la realidad teatral parece ser la misma que atraviesa a todos nuestros países, me haces pensar en el panorama de ecuador y en la necesidad de de crear una revista sudamericana (hay tan pocas, o, en su defecto, tan mal distribuidas) en la que se pueda mostrar esas particularidades de nuestras ciudades, en las que nos podemos identificar, y, a partir de ahí, generar debates, hallar soluciones, reinventar la escena. un gran abrazo.

Pablo Berned disse...

Maiquitio:

te sugeri o texto do Gilberto Dimenstein, mas não sou favorável à leitura reducionista dele... aqui tem o link para outros textos que colocam o vale-cultura como positivo:

http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/valecultura-para-trabalhadores/

http://www.casacinepoa.com.br/o-blog/jorge-furtado/vale-cultura

http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=60590

O debate está na mesa... Até.

Marcelo Ádams disse...

Há algum tempo, li que o gaúcho sofre de síndrome de inferioridade, e seria esse o motivo de nos mostrarmos tão aferrados às nossas raízes "gaúchas". Isso explicaria o menosprezo que grande parte das pessoas tem pelas produções teatrais gaúchas. No entanto, quando algum espetáculo com artista gáucho faz sucesso acima de Santa Catarina, parece que isso é garantia de qualidade. Se os lá de cima gostaram, deve ser bom mesmo! Nem vou entrar no mérito do tipo de espetáculo gaúcho que tem público certo. Todos nós sabemos. Mas que dá raiva, dá.

Colin disse...

Muito pertinente!

Maico Silveira disse...

E aí, gente!
Obrigado pelas indicações, Pablo. Os links que tu indicou já estão no texto.

Abraço!

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