Ontem, no ônibus ainda, aconteceu algo inusitado: um bichinho subiu na minha mão. Era uma joaninha ou algo parecido. Meu primeiro impulso ao sentir seu toque foi dar um cascudo e jogá-lo longe, mas freei a ação segundos antes de fazê-lo e temi pelo destino do bichinho: estávamos em um veículo com ar condicionado completamente fechado, o que significava que eu não tinha condições de jogá-lo pela janela aliviando minha consciência por tê-lo devolvido à natureza, ainda que sabendo que ele estaria no asfalto sujeito a qualquer pneu desavisado. Ademais, se desse o cascudo, ele iria ao chão e não sairia daquele ambiente, podendo ser simplesmente pisado por alguém. Resolvi, então, mantê-lo caminhando entre meus dedos (o que não é fácil porque esse tipo de inseto nunca pára e é sua mão que precisa movimentar-se para que ele continue, enfim, caminhando em círculos sem saber) até o ponto de descer e deixá-lo em uma árvore. Isso passou a ser meu objetivo naquele instante, e a mulher que se sentou ao meu lado algumas paradas depois deve ter estranhado muito minha relação com meu novo amigo. Era uma ação meio autista: um cara sentado mexendo a mão enquanto um inseto caminha por ela. Mas isso não importava naquele momento, o que importava era o objetivo maior: deixá-lo a salvo em uma árvore quando descesse do ônibus. E foi o que fiz, por mais difícil que fosse levantar com o ônibus em movimento e segurar-se no pega-mão sem esmagar o bichinho que estava perto da minha palma – tudo isso ajeitando minha mochila e pedindo licença à moça aquela que estava do meu lado. Desci, coloquei-o na árvore. Missão cumprida. Então, enquanto ia para casa, começou a viagem: e se depois de tanto cuidado, ainda sentado no meu lugar no ônibus, eu perdesse o bichinho de vista? Sei lá, se ele entrasse pela manga da minha camiseta, como eu o tiraria de lá sem esmagá-lo? Ou pior, será que eu não teria um desses sobressaltos assustados que fazem espanar o local por onde o inseto acabou de entrar? Isso seria o seu fim, certamente. Ou ainda: Se na hora que eu tivesse levantado, o ônibus tivesse dado uma freada brusca, me obrigando a segurar repentinamente no pega-mão, esmagando o bichinho que, aí sim, estaria no centro da minha palma? Imagina a minha reação... imagina a reação daquelas pessoas que tinham acabado de presenciar uma inesperada interação entre homem e inseto. Quem ia começar a rir do homem, pelo seu trabalho mal-sucedido e sua estupidez? Quem deles iria sentir pena do bichinho que estava a um passo da sua liberdade? Qual homem, qual mulher iria compreender a seriedade do momento onde uma tentativa de resgate foi mal sucedida e a vítima havia se perdido para sempre...?
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