sábado, 10 de janeiro de 2009

Berkeley em Bellagio

Sempre tive o hábito de comparar coisas com outras coisas. Bom, até aí, normal. Nada do que outras pessoas já não façam. Tenho até que confessar que às vezes acham que estou inventando as comparações e que o que digo não tem nada a ver com o que vemos. Mas sempre tenho as justificativas necessárias para sustentar meu ponto de vista: “se tirarmos a calçada daqui e colocarmos uma desse tipo, será igual à rua x”, “olha aquela pessoa. Se a gente troca o cabelo (ou o nariz) ela vai ficar igual ao fulano”. É a teoria das fôrmas (1), aquela que diz que certas pessoas, mesmo que não se conheçam, vieram da mesma fôrma (2).


Quando acontece de estarmos longe de casa, essas comparações passam a acontecer mais seguidamente. Talvez essa seja também uma forma de aproximação com o novo contexto no qual estamos inseridos, de tornar familiar o desconhecido. Os Oriundos, por exemplo, já chamaram a Corrientes (rua de Bsas (3)) de Voluntários da Pátria (rua de Poa), a Florida (idem 1) de Rua da Praia (idem 2), e o cruzamento das duas de Esquina Democrática (idem tudo). Sim, era parecido, não vou dizer que não. Eu fui um dos que chamaram. Claro que também já chamei a Travessa dos Venezianos de San Telmo, já estendendo a comparação entre uma rua e um bairro. Dessa forma o Colón vira um “grande São Pedro”, e chamamos de Alfândega uma praça perto do La Bombonera (que ficava perto de uma avenida que parecia a Padre Cacique).


Enfim...


A distância sempre potencializa as coisas. Sentimentos, comparações, vozes, pedaços de cidade, tudo ganha uma outra dimensão. Não só a distância física, como é o caso de quem escreve esse texto hoje, mas também a outra distância, aquela que nos faz morar na mesma cidade e não nos vermos por um longo período, por exemplo. Um dia você acorda pensando em alguém (“faz tempo que não vejo fulano”), e jura que o fulano está pensando o mesmo. Você liga pra ele, mas não é atendido. Você deixa um scrap e ele demora cinco dias pra responder, se chegar a responder. Pois é. Coisas do humano.


Bem, nesse sentido continuo minhas comparações que às vezes só fazem sentido pra mim. E por isso que esses dias virei subitamente para trás durante uma aula a fim de ver quem tinha dado aquela risada igual à da Mari (na verdade, no ímpeto, quase disse “Mari?”). Aliás, ela também se assemelha a uma colega da casa de estudante onde moro: Uma italiana chamada Valentina (4). Tá certo que a Valentina é uma Mari, digamos, em início de faculdade, mais maluca, por assim dizer... mas aquela camisa xadrez não me engana!


Na mesma casa, mora o Koltès, digo, o Lukas, um alemão que parece o Koltès (na minha cabeça, repito). Já disse que ia mostrar uma foto do autor francês para ele, mas não sei se quero correr o risco de ouvi-lo dizer que não tem nada a ver. Ele é vizinho de porta de uma menina que me lembra a Paola, mas aí é uma semelhança postural, gestual, sei lá. Só sei que lembro de uma olhando para a outra. E a Irene quase chega a ter uma carinha de tartaruga (comparação afetuosa que faço com o rostinho redondo da Lola).


Que mais...? O Zé Mário Storino é meu professor de “Pesquisa Qualitativa”. Juro. Esse é uma combinação de olhar e sorriso. Igual. Sem tirar nem pôr. M. Henry, ele se chama. Poderiam ser irmãos, perfeitamente. O mesmo digo de um outro professor, M. Dubois, que é igual ao Clóvis (professor do Dad). Este eu não preciso me questionar muito: a Camila Bauer, que conhece os dois, concordou comigo e assinou embaixo. Ufa...


Falando nisso, lembra da Voluntários que citei lá no início? Achei. Fica no Boulevard de Rochechouart, metrô Anvers. Essa comparação também tem aprovação: quando contei pra Camila que encontrei “nossa Voluntários”, ela disse que o Clóvis (o mesmo do parágrafo anterior), um dia a pegou pela mão e disse “Vem que vou te mostrar a Voluntários daqui...”. Ufa 2...


Mas também acontece de as comparações virem todas juntas, o que aconteceu quando fomos num pub que tocava jazz. A dona da idéia foi a Lisa, que estava louca para cantar no evento. Explico: a banda toca um pouco, com sua vocalista original, depois abre para quem quiser vir cantar algo. E as pessoas vão! E as pessoas cantam muito, muito bem! (comecei a perceber que não eram quaisquer pessoas, já que portavam suas partituras para não correr o risco de a banda não conhecer a música proposta). Muito legal essa idéia. Mesmo.

A noite corria normal até o momento em que fui no banheiro e demorei cinco minutos para conseguir abrir a torneira. É que tinha só a torneira, não tinha como abri-la. Depois de procurar por todos os cantos, vi que era preciso pisar num negocinho lá embaixo para fazer sair água aqui em cima (uma coisa meio como aquele aparelhinho dos caça-fantasmas onde a gente pisa para caçar-fantasmas). (5)


Bom, quando saí de lá minha vida mudou. Primeiro, porque estavam chegando no barzinho o Sílvio (colega do Caixa-preta), ou alguém que se parecia muito com ele, e o Mauro Soares, ou alguém que se parecia muito com ele – ou talvez fosse apenas o óculos que escondia todo o rosto... vai saber... Segundo que, como um golpe de realidade – ou seria de (muita) ilusão? –, percebi que conhecia todo mundo da banda. É sério. E dessa vez, tenho até uma foto para mostrar, do momento em que a Liza estava nos presenteando com sua voz:


Foto do Maico. Ele sabe que tá sem qualidade. Se tiver muito ruim, olhe pelo Facebook.

Sob o símbolo do Café Universel Paris, da esquerda para a direita: “Leônidas” no piano, Liza ao centro, “Lipsen” no baixo e “Zé Leandro” na bateria.


É bom quando a gente descobre essas coisas, ao mesmo tempo que é triste não poder cutucar ninguém nessa hora, já que ninguém conhece as pessoas em questão. Mas também é um alívio descobrir com quem o outro se parece.


E aí, o que fica? Sei lá... as coisas se repetem num constante vai-e-vem de cidades, pessoas, coisas, músicas, semelhanças... e no fundo a gente fica pensando que tudo é igual, com um monte de coisas que as diferenciam (6). Será que todas as cidades são iguais? Será que o porto de Santos é tão parecido com o de Porto Alegre? Será que Milão parece mesmo um canto escondido cinza e industrial de São Paulo? Rogério Ceni e Luciano Hulk? Thomas leabhart é mais parecido com o mestre dos magos ou com Anthony Hopkins?


De qualquer forma, esta semana, a última de aulas deste semestre, tenho que fazer comparações escritas para uma aula: “Estudo Comparativo de Práticas Performativas”, do prof. Clóv... digo, Dubois (7). E, após ler este texto confuso e cheio de notas chatas, percebi que não sou nada científico.


Tanto pior. Vai saber o porquê de este texto ter o título que tem.


“Qualquer semelhança é mera coincidência”


?



(1) Essa teoria não se encontra oficialmente em nenhum lugar. Eu que inventei isso pra mim mesmo há uns seis anos. Mas se alguém quiser, pode até fazer uma tese sobre isso, afinal de contas tudo pode virar tese. Aliás, percebam que este texto tem notas de rodapé. Que científico, não?


(2) Sim, escrevi fôrma com acento. Não queria correr o risco de ser confundido com a palavra forma. Só que, como agora mudou um monte de coisa na nossa gramática, a gente pode errar um monte de acento com desculpas. Por isso nem procurei a grafia correta, sempre vai ter algum mestre em letras em Santa Maria para me corrigir.


(3) “Buenos Aires”, segundo I. A. Marocco.


(4) Tem foto da Valentina no tópico da neve.


(5) Esse comentário não tem nada a ver com as comparações. É só uma forma de dizer que aconteceram coisas estranhas.


(6) O que talvez fosse diferente de afirmar que as coisas são diferentes com alguma coisa que as aproxima.


(7) Ver o sexto parágrafo do presente texto.

9 comentários:

Andante nos Ventos disse...

Maiquito...

sei como é isso... Acho que a gente fica querendo essas pessoas por perto e por isso as vê nos outros...

E são nossas referências que acabamos comparando. Athenas pra mim é um São Paulo que fala grego, pra mim lá tudo era igual a São Paulo, a não ser quando eu chegava nas areas arqueológicas, que pensava estar dentro dos meus livros hehehehe...

São Paulo eu achei uma rua que conseguia misturar, Farrapos, Voluntários e Lima e Silva num mesmo espaço... Era uma rua única, mas eu precisei comparar com algo, pra poder descrever o que via pra mim mesma...

Só Brasília tu não pode comparar com nada, porque ela é única...
Não tens como achar outros lugares aqui... Mas achas coisas em outros lugares que sejam daqui...
Mas o bairro menino deus de porto, mas especificamente a rua botafogo, é a 109 sul, sem dúvida... E tudo que seja anos 50 será igual a Brasília. Será porque eu sou daqui que penso assim?

Mas bem te digo que eu andando no rio, descendo a rua da feirinha, em laranjeiras, vi um cara igual o diones... inacreditavelmente igual (talvez porque fosse ele?) e depois em ipanema encontrei o Denis, incrivel que o cara tava com um namorado igual o gustavo...

Hehehe... eu sempre acho pessoas parecidas com minhas referências... quando não acho, penso nelas e gostaria de estar ao lado delas e cutucá-las pra ver as coisas que estou vendo...

Agora comentando o teu texto... Porque eu ainda não fui encontrada em Paris??? Quero estar aí...
Isso significa que não queres me ver??? que não estás com saudades?? mmmm...mmm.. bbb... bbb.. uááá... buáááá...

Ok... ainda assim te amo!!!
Aproveita muito tua viagem!!!

Besos

Andante nos Ventos disse...

PS: acho que eu vou criar um blog pra poder comentar o teu... hahahahaha... olha o tamanho disso???

Maico Silveira disse...

Olha, Ferr, na verdade eu te achei parecida com alguém, sim... A Rebbeka, do outro texto, tem um jeito que me lembra de ti. Só que não escrevi porque não tinha muita base para comparar. Tu falou que Brasília é única e, sim, a Rebbeka também é de lá. Aí fico pensando que os brasilienses também são únicos e um lembra o outro... será???

Agora, sobre comentar o blog, seria ótimo! Tu pode fazer um falando mal dos meus textos, assim logo logo estaríamos os dois na mídia, se odiando e discutindo em programas de auditório!

Unknown disse...

AHAHHAHAHAHA!
Eu fui comentar o texto comparativo que adorei.
E ai tive que ler os comentarios da Ferr e agora to rindo sem parar.
Eu tb teho essa mania de comparacaes, todos temos (acho).
Achei em Londres um bairro que me lembrou a cidade baixa, mas depois pensando bem acho que era soh saudades.
Beijos!

Unknown disse...

Isso tá parecendo um refugio de exilados... kkkkk

Maico adorei a idéia, será que assim a gente ganha dinheiro? Depois a gente racha 50-50, ok?
Me diz uma coisa, olha os teus dedos da mão direita? Vê se os teu dedo anular é maior que o indicador (agora a gente tem que analisar as parcerias monetárias assim, kkkk).

Unknown disse...

boiou??? dá uma olhada no g1, jornal da globo de quarta feira.

Beijos

Unknown disse...

Ah! E quanto as pessoas de Brasília serem todas iguais... sim, somos...

Assim como todos paulistas são iguais, por quererem ser tão diferentes. Cheguei a essa conclusão esses dias.

Beijos e boa noite

Pablo Berned disse...

Sobre o novo acordo ortográfico: não some o acento diferencial apenas em pôr (verbo) / por (preposição) e pôde (pretérito) / pode (presente). Fôrma, para diferenciar de forma, pode receber
acento circunflexo.

andré m. disse...

hum... também sofro desta sindrome de comparaçoes... o que me diz quando duas pessoas conhecidas tomam o corpo de uma pessoa daqui? tipo o olhar de um, mas o jeito de atender o telefone de outro... hein? como explicar?
ah e o philippe henry seria o pai do zé mario, né?
e se tu me encontrares em paris, pode vir falar, provavelmente sou eu mesmo.
beijo e até breve.

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